Homem que morava em imóvel dentro da empresa terá salário-utilidade

TRT-3 concluiu que a habitação tem natureza salarial, porque não era fornecida para viabilizar a execução do trabalho, mas em razão dele.

Ex-colaborador de uma construtora que residia em imóvel situado dentro do pátio da empresa consegue salário-utilidade de moradia. Julgadores da 1ª turma do TRT da 3ª região concluíram que a habitação tem natureza salarial, porque não era fornecida para viabilizar a execução do trabalho, mas em razão dele.

Nos autos, consta que um ex-trabalhador residia em imóvel pertencente a empregador localizado dento do pátio da empresa. Na Justiça, ele pediu a incorporação do salário-utilidade da moradia e do pagamento dos reflexos dele, o que foi negado em 1ª instância.

Em recurso, o pedido do trabalhador para que o valor do “aluguel” fosse acrescido à sua remuneração não foi acolhido, ao fundamento de que ele efetivamente residia no imóvel e não sofreu descontos financeiros por esse motivo.

“Entendimento contrário, representaria enriquecimento sem causa do autor, o que é vedado pelo ordenamento jurídico”, afirmou a desembargadora e relatora do caso Adriana Goulart de Sena Orsini.

O entendimento adotado se baseou no artigo 458 da CLT. Segundo a regra, além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a habitação, o vestuário ou outras utilidades (prestações in natura) que a empresa, por força do contrato ou do costume, forneça habitualmente ao empregado, por representarem um “plus” ou acréscimo remuneratório. O parágrafo segundo da norma legal, por sua vez, ressalva que as utilidades concedidas “para a prestação do serviço” não possuem caráter salarial.

Na decisão, a relator se referiu à súmula 367 do TST, que, em harmonia com a norma celetista mencionada, estabelece que a habitação fornecida pelo empregador não tem natureza salarial, se for indispensável para a realização do trabalho. É que, neste caso, a moradia seria concedida “para o trabalho” e não “pelo trabalho” ou em razão dele, ou seja, a concessão da moradia não seria forma de remuneração do serviço prestado.

No caso, ficou demonstrado que a empregadora fornecia moradia ao trabalhador e, dessa forma, segundo pontuou a relatora, cabia à empresa provar a necessidade do imóvel para a viabilização da prestação de serviços, nos termos do art. 373, II, do CPC, o que, entretanto, não ocorreu.

Prova oral

Em depoimento, o trabalhador disse que o imóvel ficava dentro do canteiro de obras da construtora e que este era seu local de trabalho, o que foi confirmado por testemunha, que afirmou que “o autor morava dentro do setor de trabalho”.

Outra testemunha, esta ouvida a pedido da empresa, quando perguntada sobre o motivo de o reclamante residir no pátio da empresa, respondeu que “acho que era para facilitar o serviço”.

Mas, na análise da relatora, a prova oral produzida não indicou que havia necessidade de o autor residir no pátio da empresa para facilitar a prestação de serviços, tendo sido impreciso, quanto a isso, o depoimento da testemunha da empresa.

“Ora, não há provas de que a concessão da habitação teve por objetivo atender à necessidade do serviço, sendo perfeitamente possível ao reclamante morar em qualquer outra residência existente na cidade.”

A inexistência de prova esclarecedora em sentido contrário levou à conclusão de que a habitação tinha natureza salarial, ou seja, que não era fornecida para a execução do trabalho, mas em razão dele. Conforme ressaltado na decisão, a concessão da moradia configura salário-utilidade, porque tinha caráter retributivo, assumindo a feição de salário “in natura”, incorporando-se ao salário do empregado.

Valor da moradia

Para efeito de incorporação ao salário e de pagamento dos reflexos nas demais verbas salariais, o autor pretendeu que o valor da moradia, ou do “aluguel” do imóvel em que residia no pátio da empresa, fosse fixado em R$ 700 mensais. Mas o valor do salário-utilidade acabou sendo arbitrado em R$ 500, com fundamento nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, assim como nas regras da experiência comum, aplicadas pela observação do que ordinariamente acontece, nos termos do ar. 375 do CPC. O trabalhador já recebeu os créditos trabalhistas e o processo foi arquivado definitivamente.

Por fim, os julgadores acolhendo o voto da relatora e deram provimento ao recurso do trabalhador, para modificar sentença do que havia negado a incorporação pretendida. A empresa foi condenada a pagar ao ex-empregado os reflexos do salário-habitação, fixado em R$ 500 mensais, no aviso-prévio indenizado, horas extras, férias + 1/3, 13º salário e FGTS + 40%.

(Processo: 0011246-14.2021.5.03.0142)

Informações: TRT da 3ª região